GRANJA ENTRE AS 24 MELHORES ESCOLAS PÚBLICAS DE ENSINO FUNDAMENTAL DO PAÍS E DO CÉARÁ

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Na sala de aula da escola São Joaquim, no distrito de Canto, em Coreaú, o livro de Geografia estava fechado sobre uma carteira vazia de aluno. As mesas foram afastadas para as laterais da sala para abrir espaço ao centro. Com as mãos sujas de cola e tinta guache, sete alunos do 6° ano não desgrudavam os olhos das maquetes que faziam para explicar a diferença entre metrópole e campo. Nenhum deles já visitou uma metrópole, mas nada que a leitura e a imaginação não propiciem o mínimo de conhecimento.

 

Foi esse mesmo grupo de alunos que, em 2015, obteve uma das mais altas médias na Prova Brasil, avaliação do Ministério da Educação (MEC) que analisa a aprendizagem dos alunos brasileiros em português e matemática. A nota da prova juntamente com o fluxo escolar (taxa de aprovação) são as bases do resultado do Ideb.

 

Neste ano, escolas de Coreaú e Sobral dispararam para o primeiro lugar no ranking nacional do MEC, com a média 9.8. Os municípios garantiram, respectivamente, outras duas e cinco escolas entre os 24 primeiros lugares do País.

 

Além delas, chama atenção a presença do município de Granja com três escolas entre as 24 melhores. Lá, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é o penúltimo mais baixo do Ceará, mas, nos últimos 10 anos, a Educação foi o índice que mais cresceu em termos absolutos na cidade.

 

Em todas as seis escolas visitadas, soluções simples – mas planejadas e executadas a rigor – desmistificam discursos de que, para avançar, a educação precisa de muito dinheiro e investimento em tecnologias.

 

Entre os exemplos da rotina das escolas, atividades tradicionais e semelhantes em todas elas: controle rigoroso da frequência escolar, reforço para alunos com dificuldades, avaliação constante, dever de casa, correção de tarefas em sala de aula, garantia da merenda escolar e do material didático.

 

Outras ações voltadas para a gestão tambem são partilhadas entre as escolas: consultorias educacionais, capacitação de professores, aumento salarial, premiação em dinheiro e autonomia da direção escolar.

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IDEB 2015

 

Entenda o índice

 

O que é o Ideb?

 

O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica foi criado para avaliar a qualidade de escolas e das redes de ensino. Ele combina a taxa de aprovação escolar com o desempenho dos alunos.

 

Como esse desempenho é medido?

 

São usados os resultados de dois exames oficiais (Saeb e Prova Brasil), aplicados a cada dois anos no 5o e no 9o ano do ensino fundamental e no 3o ano do médio.

 

Como são as provas?

 

Elas avaliam os conhecimentos dos estudantes em português e matemática e acontecem em todas as escolas públicas com pelo menos 20 matriculados. No ensino médio e na rede privada, a aplicação é por amostragem.

https://youtu.be/GUJFTY7xtFM

Granja – CE

“Em um lugar muito distante, onde tudo é verdejante, lá no fim do arco-íris, morava o Grilo Lino, bichinho verdinho, de pernas compridas, que vivia a cantar, procurando um amigo para poder cativar”: todos na sala de aula da escola Eliezer Arruda, no município de Granja, param para ouvir a pequena Eulaila Souza, de 5 anos, ler a história “O Grilo e a Lua”.

 

Ela ainda nem começou o ensino fundamental e tem uma fluência de leitura no nível de alfabetização. A cadência da leitura, a pontuação bem marcada e a entonação chamam atenção. Eulaila é um dos exemplos do esforço de educação na escola, que está entre as 10 primeiras colocadas no ranking do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) 2015.

 

Segundo o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, Granja tem o segundo menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Ceará – que mede a qualidade de vida da população, na frente apenas do município de Salitre, o mais miserável do Estado. Os dados do último levantamento, em 2010, mostram que, no período de 10 anos, a Educação foi o índice que mais cresceu em termos absolutos na cidade. No Ideb 2015, Granja tem três escolas entre as 24 melhores do País.

https://youtu.be/fftMYdkKpmo

A mãe de Eulaila, Aparecida Souza, 24, é toda orgulho da filha. “Depois que ela começou a estudar aqui, se desenvolveu bastante, os professores são todos muito empenhados no que fazem”, pontua. A jovem acompanha de perto a educação da filha.

 

A parceria da família com a escola é um dos diferenciais apontados por Eliane Pinheiro, 35, mãe de Lucas Pinheiro, de 8 anos, aluno avaliado na Prova Brasil de 2015 na Eliezer Arruda. “Trabalho em outra escola e não vejo o acompanhamento das famílias. Aqui, em toda reunião, os pais estão presentes”, ressalta.

 

Em 10 anos, de 2005 a 2015, o Ideb de Granja no Ensino Fundamental I subiu de 3,3 para 7,3. A escola Eliezer Arruda mais que dobrou a nota no exame de 2013 para 2015, de 4,0 para 9,3, superando a meta projetada para 2021, de 5,6.

 

O modelo para a nova realidade vivida pela educação segue padrões adotados nos municípios vizinhos, inspirados principalmente na gestão de Sobral: capacitação de professores, garantia de material escolar, atenção individualizada a alunos com maior dificuldade, controle da frequência, merenda escolar de qualidade e foco na habilidade de leitura.

 

Granja, como outras dezenas de municípios do Ceará, mais do que simplesmente figurar nas primeiras posições de rankings de avaliação, conseguiram algo ainda mais extraordinário: atender alunos de baixíssima renda e elevar seus conhecimentos a níveis de estudantes de nações mais desenvolvidas.

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A maior parte dos cerca de 52 mil habitantes de Granja vive na zona rural. Os alunos dependem do transporte escolar oferecido pela Prefeitura. O sub-secretário da Educação, Fernando Angelim, afirma que a gestão tem priorizado a qualidade do transporte e substituídos os velhos “paus de arara”, mas a precariedade dos veículos ainda é gritante. Enquanto a reportagem do Tribuna do Ceará acompanhava a saída dos alunos, duas caminhonetes foram flagradas.

 

“Quando recebemos o município, tínhamos 14 escolas entre as 150 piores do Estado. No primeiro ano (de gestão) começamos a resolver. Conseguimos colocar três escolas, em 2014, entre as 150 melhores do estado. Em 2015, conseguimos colocar cinco entre as 100 melhores do Brasil”, afirma Fernando.

 

Dentre as mudanças, uma atenção especial à alimentação das crianças. O município passou a controlar a distribuição da alimentação para que não houvesse lacuna no abastecimento e a ofertar dois lanches para os alunos da educação infantil: um quando a criança chega à escola e outro no horário tradicional de intervalo.

 

“Uma criança melhor alimentada aprende melhor”, pontua a diretora da escola, Denise Pereira.

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Na prática

 

Local, data, destinatário, saudação, assunto, despedida e assinatura: no dia em que o Tribuna do Ceará visitou a escola Eliezer Arruda, os alunos do 2° ano aprendiam a escrever uma carta. O destinatário era o mesmo: o Papai Noel. Antes, liam “A Carta do Gatinho para o Papai Noel”, com todos os exemplos.

 

“Querido Papai Noel, sei que neste ano não me comportei como deveria, rasguei o sofá, a cortina, quebrei o jarro da mesa da mamãe…”, confessava o gatinho. A partir do lúdico, as crianças vão aprendendo as regras da escrita e desenvolvendo as habilidades de uma boa alfabetização.

 

“Aqui, a gente não prepara só para a prova (Prova Brasil). Tem uma mãe que sempre diz pra mim que o filho dela não sabia ler, e o marido dela dizia que ele não aprendia porque tinha deficiência. Ela dizia: ‘Ainda vou encontrar uma professora que vai fazer com que meu filho aprenda'”, conta orgulhosa a professora Maria do Livramento Monção de Carvalho, de 26 anos.

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Indisciplina

 

Diante dos esforços para alavancar a educação, a gestão de Granja esperava bons resultados no Ideb, mas se surpreendeu com a presença de três escolas no topo do País. Outra delas, a escola Dona Arzília Mota, recebe o nome de uma ex-professora do município e está localizada em um dos bairros mais pobres da cidade, o São Pedro.

 

“Aqui é todo mundo pobre mesmo, não tem ‘classe média baixa’. A maioria das famílias são carentes de tudo, carentes financeiramente, carentes de educação, carentes de cultura”, lamenta o diretor da escola, Pedro Elias Sousa.

 

Há pais que, diante da pouca educação que receberam, não veem futuro em mandar o filho para escola, não enxergam perspectivas de melhorar de vida através da escola.

 

No final de 2012, quando a nova diretoria chegou à escola, a Arzília Mota, por estar entre as 150 piores do Estado, era apoiada por outro município. De lá para cá, a realidade mudou. Hoje, a Arzília Mota apoia escolas no município mais rico do Estado: a capital, Fortaleza. Nessa relação, as escolas fazem seis visitas uma a outra para trocar experiências sobre o dia a dia e as metodologias utilizadas para melhorar a condição da parceira.

 

“O maior desafio hoje é a questão da disciplina. A indisciplina é o que tem causado grandes transtornos na escola, dificultando o trabalho do professor”, ressalta Elias. Há casos em que os pais dos alunos são convidados para assistir à aula junto ao filho.

 

Não à toa, o problema é pontuado em todos os níveis. O aluno Marcelo Magalhães, de 12 anos, um dos destaques da escola, afirma que, se pudesse promover alguma mudança, ela seria no compromisso dos outros colegas.

 

“Eu queria que os alunos focassem mais nos estudos, porque não tem muito aluno focado. Melhoraria (isso) para a escola ter mais desempenho”, diz Marcelo.

 

A professora Niciane dos Santos Dourado, de 34 anos, dá aulas na Arzília Mota há oito e frisa que o maior desafio nesse tempo foi estabelecer uma parceria com a comunidade. “Quando os pais começaram a se conscientizar que o aluno, quando chega em casa, também tem que estudar, o rendimento começou a melhorar”, afirma.

 

Os planos para 2017 são positivos: com o dinheiro que recebem do Governo do Estado quando são avaliadas como Escola Nota 10, a previsão é de levar mais conforto para os alunos, com algumas salas de aula climatizadas.

 

A educação possibilita avanços. Se nem sempre físicos e imediatamente visíveis, como uma boa estrutura escolar; esses avanços se operam dentro de cada aluno e de cada família, abrindo caminhos para um futuro com novas oportunidades.

https://youtu.be/onN26SFsYWM

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No estudo, apenas três escolas, em todo o Brasil, passaram pelo teste de seleção. Todas no Ceará: E.E.F. Manoel Luiz de Carvalho (Pedra Branca), E.E.F. Miguel Antonio de Lemos (Pedra Branca) e E.E.F. Maria Leite de Araújo (Brejo Santo). Após ajuste dos critérios, foi acrescida a escola Gerardo Rodrigues (Sobral) e outras duas, de Belo Horizonte e São Paulo.

Fatores que influenciam a menor taxa de sucesso nos anos finais

 

  • Defasagens de aprendizado acumuladas do 1° ao 5° ano.

 

  • Alunos com níveis de aprendizado muito heterogêneos em uma mesma turma.

 

  • Os temas previstos para os anos finais são mais complexos, no entanto muitos professores ministram disciplinas para as quais não foram formados.

 

  • Alunos precisam se adaptar ao novo sistema de ensino composto por vários professores.

 

  • A mudança de escola que pode dificultar a continuidade do trabalho.

 

  • Particularidades socioemocionais ligadas à adolescência.

 

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Tribuna do Ceará

 

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